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A Inaplicabilidade do Aumento de Pena ao Estupro de Vulnerável

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Juridiq

A discussão sobre a inaplicabilidade da causa de aumento de pena prevista no inciso II do artigo 226 do Código Penal Brasileiro (CP) ao crime de estupro de vulnerável, estabelecido no artigo 217-A, realizado na modalidade omissiva, levanta questões importantes sobre a vedação ao bis in idem no direito penal. Este princípio jurídico preceitua que não é permitido penalizar duplamente um indivíduo pela mesma conduta ilícita. Analisaremos aqui a fundamentação jurídica dessa inaplicabilidade e a jurisprudência relevante.

Estupro de Vulnerável e Omissão Imprópria

O artigo 217-A do Código Penal define o crime de estupro de vulnerável, que consiste em ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos. Este tipo penal visa proteger a integridade sexual de indivíduos considerados incapazes de consentir por conta de sua idade ou condição mental.

O crime pode se dar por ação ou omissão. A omissão imprópria, também conhecida como omissão penalmente relevante, está delineada no artigo 13, §2º, “a”, do CP, onde se estabelecem as condições pelas quais um indivíduo pode ser responsabilizado penalmente por omissão. Estas condições incluem o dever legal de agir, especialmente quando a pessoa detém um vínculo de responsabilidade sobre a vítima, como no caso de parentesco.

Responsabilização Penal do Omissivo

No cenário em que C, genitora de B, deixa de impedir ou denunciar o estupro perpetrado por A contra sua filha, ela pode ser responsabilizada criminalmente. Esta responsabilização se dá em razão de sua omissão imprópria, configurada pelo dever legal de proteção conferido pela relação de maternidade.

Assim, C é enquadrada no artigo 217-A, não pela prática direta do estupro, mas pelo fato de sua omissão ter permitido a ocorrência do crime. O artigo 13, §2º, "a" do CP fornece a base legal para esta tipificação, afirmando que quem tem por lei o dever de cuidado, proteção ou vigilância e omite-se, responde pelos resultados advindos de sua inação.

Impossibilidade da Aplicação da Causa de Aumento

A causa especial de aumento de pena prevista no artigo 226, inciso II, do CP dispõe sobre o acréscimo de metade da pena se o agente for ascendente, padrasto, madrasta, tio, irmão, cônjuge ou companheiro da vítima. No entanto, aplicar este aumento de pena a C geraria um problema de bis in idem.

O bis in idem ocorre quando a mesma circunstância é usada para fundamentar a condenação e, simultaneamente, para aumentar a pena, o que é vedado pelo direito penal brasileiro. No caso em questão, a relação de maternidade de C já foi utilizada para configurá-la como garantidora, conforme o artigo 13, §2º, "a". Usá-la novamente para aumentar a pena caracterizaria uma dupla valoração pela mesma circunstância.

Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se posicionou sobre este tema, sustentando a inaplicabilidade da causa de aumento de pena em casos semelhantes. Em decisão da Sexta Turma, foi confirmado que a condição de mãe, utilizada para imputação de responsabilidade penal na modalidade omissiva, não pode ser utilizada novamente para elevar a pena com base no parentesco, sob pena de bis in idem.

[...] Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou não ser possível aplicar o aumento de pena decorrente da relação de parentesco ou autoridade sobre a vítima (artigo 226, inciso II, do Código Penal) a uma mulher que foi condenada pelo crime de estupro de sua própria filha, na modalidade omissão imprópria. Para o colegiado, a posição de mãe constitui elemento normativo do tipo penal, de modo que considerar essa condição para elevar a pena caracterizaria bis in idem (dupla punição pelo mesmo fato), o que não é admitido pelo ordenamento jurídico.

Conclusão

A vedação ao bis in idem é um princípio fundamental que assegura a justa aplicação das leis penais. No contexto do estupro de vulnerável cometido através de omissão imprópria, a relação de parentesco utilizada para fundamentar a imputação de responsabilidade não pode ser novamente utilizada como causa de aumento da pena. Este entendimento é corroborado pela jurisprudência do STJ, que visa impedir a dupla valoração de uma mesma circunstância para fins punitivos.

  • Diferença entre ação e omissão no direito penal
  • Princípio bis in idem
  • Artigo 217-A do Código Penal
  • Responsabilidade penal por omissão
  • Jurisprudência sobre aumento de pena
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